segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Kant e a educação








Kant, um dos mais importantes filósofos da história, foi diretor e professor. Ele representou um dos momentos mais significativos da filosofia na Idade Moderna, e ainda influencia profundamente os pensadores da atualidade.
A filosofia de Kant, mais tarde designada como criticismo, representa a crítica mais radical a esta proposta do pensamento metafísico tal qual foi desenvolvida na IdadeMédia.
Na Idade antiga e na Idade Média prevaleceu o modo metafísico de pensar. Para os filósofos dessa época, as coisas possuíam uma existência autônoma, objetiva, independente da consciência humana. Elas eram essência criada por Deus, coexistindo eternamente. Assim, havia uma idéia de arvore perfeita e as arvores que percebemos com os nossos sentidos são cópias imperfeitas de sua essência. O pensamento metafísico buscava conhecer os objetos atingindo sua essência. Do ponto de vista filosófico, a Idade Moderno é uma ruptura. Seus filósofos acreditavam que todo conhecimento somente poderia vir a partir da razão natural, abandonando a metafísica e substituindo-a pela ciência. Um período marcado pelo racionalismo e pelo naturalismo.
Com o avanço do racionalismo e do naturalismo, já no final da Idade Média e começo da Idade Moderna, os homens vão se dando conta de que o conhecimento é uma atribuição da sua própria razão, da sua razão natural, e que não existe nenhuma interferência de influencias divinas transcendentais nesse processo de representação do ser, da realidade, dos objetos e de todos os entes e de todas as situações. O que está ocorrendo é, exatamente, um processo de naturalização do mundo, de naturalização da razão humana e, consequentemente, um desencantamento da própria realidade. Os homens, por assim dizer, vão perdendo o medo de desvendar todos os supostos mistérios da realidade e isto é feito graças ao poder da sua razão natural.
Há uma profunda crença de que a razão natural trará luzes sobre o mundo, permitindo ao homem ter uma visão mais objetiva da realidade. Esse período é conhecido como Iluminismo.
De modo geral, a filosofia vai se preocupar, profundamente, com a questão do conhecimento, vai discutir a capacidade que o homem tem de conhecer a realidade e ver se realiza esse processo e, sobretudo, de estabelecer seus limites.
Os filósofos desse período mostram que não há como chegar às essências das coisas, assim, a única atitude deve ser dedicar-se ao conhecimento dos fenômenos, ou seja, aquilo que pode ser percebido pelas simples impressões sensíveis. Por meio da razão natural, da linguagem matemática e do contato experimental com os fenômenos, o pensamento científico vive um grande avanço.
O que é extremamente significativo nesse momento é que este conhecimento científico a respeito das realidades naturais permite ao homem manipular, manusear essa realidade, transformá-la como se fosse um co-criador dessa realidade. Nós estamos falando do surgimento da técnica, ou seja, a ciência ao surgir no inicia da Era Moderna e no contexto da cultura ocidental, não surge apenas como uma representação teórica da realidade, mas, sobretudo, como conhecimento dos mecanismos que permitem ao homem interferir na transformação desta própria realidade.
Na Idade Moderna, a ciência se transforma na mais importante instancia cultural, principalmente pela contribuição que pode dar à evolução da técnica e na possibilidade que dá ao homem de adequar a realidade aos seus interesses. A filosofia vive uma profunda modificação, sua principal preocupação deixa de ser conhecer a natureza do homem e passa a ser compreender o processo pelo qual os homens constroem o conhecimento.
Kant estava profundamente impressionado com o resultado da física newtoniana. Para Kant, Newton era o próprio símbolo do sucesso, do conhecimento verdadeiro que a ciência tinha trazido à cultura da sua época. O papel, então, da filosofia era o de mostrar, não só que a ciência, a física newtoniana, é o modelo exemplar do conhecimento científico, mas este conhecimento é plenamente legitimado do ponto de vista da lógica, do ponto de vista da epistemologia. É esta a tarefa que Kant se dedica.
Kant analisa o processo do conhecimento humano para mostrar que a física era a aplicação das regras fundamentais do conhecimento racional que o homem poderia desenvolver. Para isso, fará a síntese de duas filosofias: o Inatismo, de René Descartes e o empirismo dos filósofos ingleses, particularmente, de David Hume.
Os filósofos ingleses defendiam a posição de que todo nosso conhecimento só podia se dar mesmo através das impressões sensíveis, o espirito humano surgia como página em branco na qual as impressões sensíveis viriam registrar a sua representação dos dados da realidade. Descartes defendia a existência de algumas idéias inatas, que eram, por assim dizer, constitutivas do próprio espirito humano e que quando entrava em contato com o mundo natural, ele já trazia em si algumas proposições de cunho universal.o exemplo melhor desse processo seriam as ideias matemáticas, que estavam se revelando, àquela altura, muito fecundas para a construção do conhecimento científico.
De modo geral, Kant explica que o conteúdo do conhecimento vem das impressões sensíveis, como queria Hume e os empiristas. Por outro lado, para esse conteúdo ser de fato conhecido deve ser organizado e ordenado na consciência, de acordo com uma estrutura que já está no sujeito que conhece. Assim, para conhecer, o homem precisa da experiência sensível, mas também necessita de uma estrutura lógica que organize esses dados empíricos.
Foi assim que Kant construiu a sua famosa teoria do conhecimento, de acordo com a qual o nosso conhecimento é formado sim com a contribuição imprescindível de intuições que são fornecidas pela nossa sensibilidade, mas intuições que precisam ser articuladas, sistematizadas, esquematizadas por esquemas a priori, que são constitutivas da própria racionalidade humana, da própria condição do conhecimento.
Para Kant, a sensibilidade  como pensava Hume. O sujeito humano depende de esquemas ordenadores ou estruturas formais presentes, a priori, no sujeito, que são o tempo e o espaço. Com a aplicação desses esquemas ordenadores, dessas formas a priori, o sujeito consegue organizar os conteúdos que são passados a ele a partir da experiência sensível. Segundo Kant, nós não podemos aprender a essência dos objetos, mas apenas seus fenômenos, ou seja, somente aquilo que se pode observar.
O mundo, a árvore que nós estamos vendo não chega “bonitinha” assim no cérebro. Ao contrário, vem em uma onda magnética que vai pegando a retina e vai mandado, é uma coisa atrás da outra, em carreirinha. O que vai acontecer no cérebro? Aquilo que acontece na televisão. O que é a televisão? Como funciona a televisão? Na televisão a onda eletromagnética é pontual, ou seja, ela vai atrás uma da outra, quer dizer, o fenômeno, a emissão da luz verde no meu olho vem uma atrás da outra e, então, chega ao cérebro e é lá que se faz a organização. Então, primeiro uma organização espacial forma uma silhueta e depois isto dura no tempo. E a duração do tempo é que dá a ideia de uma imagem permanente. Mas o nosso olho não está vendo assim, quem está vendo assim é o cérebro. É o que acontece na televisão. O que acontece na televisão? A câmera pega a imagem e é em linhas, como a gente sabe, é uma varredura e é transmitido depois para o espaço também em ondas, em fileira, é um fio e que chega ao monitor, ou seja, vai fazer aquela varredura 24 quadros por segundo e que isso vai permitir que o olho faça o mesmo processo também, ou seja, tanto a imagem, que depois Kant joga para o conceito, são construtos. É por isso que o computador, que foi feito a imagem e semelhança do sistema nervoso, justamente, chamou-se, no primeiro momento, cérebro eletrônico e depois chama-se processador. O que acontece? Todos os comandos que nós damos são bits, são pontos unitários, (010101010...). o que o processador faz? Organiza, sintetiza, e para Kant, toda atividade do conhecimento é uma atividade de síntese e não de análise, então, este poder de sintetizar é o x da questão, mas para fazer isso, nós temos que ter o processador interno e o processador é o sujeito transcendental, porque, na verdade,o processador está imitando aquilo que supostamente nós fazemos. A gente não sabe como é que o cérebro faz tudo isso, o que a química e a neurologia têm a ver com tudo isso. Por mais que você estude na neurociência como é que o cérebro, os neurônios estão funcionando, o que acontece com eles do ponto de vista enegértico, do ponto de vista químico, a sinapse, todas aquelas coisas, o problema é que gera um sentido e que tem uma base físico-química, biológica, é inegável, tanto que se você ficar dois minutos sem oxigênio, pifa tudo. Mas ao mesmo tempo gera uma cadeia de significações que transcende esse contato físico, porque todos os nossos conceitos, por exemplo, o conceito de sofá, quando eu chego a essa representação, eu chego na do processo, eu não vejo, nós não assistimos ao processo em si.por isso, olha como tudo vai se achando, de onde vem o construtivismo de Piaget? De Kant, quer dizer, Kant mostrou que o sujeito é ativo, o sujeito não é passivo. Mas essa atividade é como se você pusesse um andaime para construir um prédio. Você põe um andaime e constrói um andar, você aumenta um andaime e constrói um próximo andar. São estruturas, estruturas armadas, aliás, andaimes chamam-se estruturas, estruturas metálicas que você vai usar para compor, e isso foi o que Piaget tentou mostrar, inclusive empiricamente. Ele tinha uma grande admiração por Kant, assim como Newton fez a física, ele queria fazer uma ciência da psicologia que mostrasse o mesmo processo, quer dizer, a psicogênese e, depois, a noogênese também, que dizer, como é que a própria razão procede dessa maneira.
Na teoria do conhecimento de Kant, além das intuições sensíveis que recebemos e da organização das informações pelas estruturas de conhecimento que todo homem possui, há uma terceira faculdade, que é a razão. A razão é a faculdade das ideias.
Qual foi o erro dos metafísicos, daqueles que buscavam a essências das coisas e, nesse sentido, Deus, que ele tanto criticava? Foi ter confundido o que era objeto das idéias, objeto do pensamento como se fosse conteúdo de conhecimento. Então, qual foi o grande equivoco da metafísica? Ter acreditado que porque ela podia pensar as ideias de mundo, as ideias de Deus e as ideias de alma, que essas entidades pudessem ser objeto de conhecimento e, portanto, existir.
Para Kant era legitimo pensar essas ideias desde que não se concluísse que fossem objetos de conhecimento. De fato, até hoje, até mesmo antes de Kant, essas ideias, Deus, nunca foi conhecido. Para Kant, quem conhece o real é a ciência, somente os fenômenos podem ser conhecidos. Alma, Deus, não são fenômenos e, portanto, não são objeto de conhecimento.
Kant era uma personalidade muito interessante e, segundo a crônica que sempre acompanha a historia da filosofia, ele teria exposto ao mordomo de sua casa as conclusões a que chegou, que se expressava nas suas três grandes obras: “ A Crítica da Razão Pura Teórica”, “ A Crítica da Razão Pura Prática” e “ A Crítica do Juízo”. Ao contar esta teoria citada, ou seja, que Deus, Alma e Mundo são ideias pensadas, mas não são realidades conhecidas, o mordomo ficou muito chocado e repreendeu, severamente, Kant dizendo: “ mas como você uma pessoa tão religiosa, (ele era adepto do pietismo, uma denominação do protestantismo, bastante rigoroso) como você uma pessoa com tão boa formação religiosa pode chegar a uma conclusão dessa, o mais sua mãe vai pensar disso?” então, Kant teria dito ao mordomo: “ não se preocupe, o que eu destruí em “ a Crítica da Razão Pura Teórica”, eu vou reconstruir em “ A Crítica da Razão Pura Prática.” E nós entramos assim na segunda parte da grande obra kantiniana. Essas três ideias da metafisica tradicional, de Deus, Alma e Mundo, que não são ideias, não saõ conceitos correspondentes a fenômenos que pudessem ser conhecidos, estas entidades que não podem ser conhecidas devem ser pressupostas, porque elas são condições sine qua non ( sem o qual não pode ser) para a legitimação e para a fundamentação da moralidade, que deve ser entendida em Kant do mesmo modo que nós entendíamos a questão do conhecimento, ou seja, a moral é um fato na realidade humana. ( veja a sutileza). Os homens praticam a moral não como uma mera circunstância histórica cultural, mas por uma necessidade interna.
Para Kant, a moral se impõe ao homem como uma força universal, assim como a ciência, a moral não se impõe por necessidade psicológicas, culturais ou sociais, mas por exigências transcendentais que constituem a própria estrutura de todos os homens. É proibido matar o próximo, não devido a leis ou por respeito ao próximo, mas por força interna que exige a bondade, um bem agir. Para Kant, o fato de um homem ser um ente moral demonstra a existência de mundo, de alma, de Deus. Entenda, existe sim, essas entidades, mas como uma ética da moral porque até mesmo os animais obedecem a lei de não matar o próximo com mais eficácia que o homem. Não se registra casos de animais assassino do próximo e nem suicidas. Só para melhor entendimento, dizemos que temos ética. Dizemos que a ética existe. Realmente existe, mas não como entidade, mas existe como uma força universal. Não é um objeto fora do homem que está lá. Assim é a alma, o mundo e Deus.
A ética, portanto, deve ser seguida pelos homens, deve haver este esforço de incorporação da ética do mesmo modo,de modo análogo a este esforço de incorporação do conhecimento científico, porque faz parte da própria estrutura constitutiva da experiência e da atividade humana. É nesse contexto, inclusive, que nós podemos conceber a contribuição que Kant para a gente pensar na educação. É interessante observar que ele não escreveu nenhum tratado que tivesse por tema especifico a educação o com a politica, mas isso transpira em toda sua obra, porque toda razão de ser da existência de uma sociedade em processo de civilização, em processo histórico e toda construção do indivíduo, está sempre relacionada com a busca da realização desta perfeição humana, de que o sujeito humano tanto coletivo, no caso da sociedade, como no individual, no caso da pessoa, toda a sua razão de ser, todo o investimento de sua existência, deve ser na linha de superar a sua condição da pura empiricidade, de pura naturalidade, de pura instintividade, para se tronar, exatamente, esse sujeito autônomo, ou seja, o sujeito age em função e a partir das condições estruturais que o constitui. É por isso que a pedagogia dele é toda baseada nesta proposta de emancipação do espirito, de emancipação do sujeito, da postura do sujeito como sujeito autônomo que atinge a sua maioridade, é essa a expressão que ele usa e para qual ele carreia todo o investimento da filosofia, todo investimento da pedagogia, no sentido de que nós passemos a nos conduzir, não por imposições externas, mas pe3la própria condição do nosso modo propriamente humano de ser, que é de ser guiado por esse sujeito estrutural, que está a base da nossa própria existência.
Kant acredita que a humanidade passa por processo de constante aperfeiçoamento e que o individuo deve buscar a perfeição no plano pessoal. Daí sua proposta pedagógica de criar condições para possibilitar a realização desse esforço. Kant valoriza a disciplina, para ele, um instrumento fecundo para que o sujeito possa tornar compatível uma existência com as pressões concretas e as circunstâncias que o envolvem. Segundo Kant, o homem deve ser culto, no sentido de aprimorar sua capacidade de conhecimento.
Isso nos mostra um Kant que, como pessoa, como educador, devemos lembrar que ele foi professor ao longo de toda a sua vida, foi diretor de ginásio, Kant levou tão a serio esse seu projeto de vida, que sequer saiu de sua cidade. Ele não viajou, ele era professor de geografia. Também formado em geografia.
Kant fez a leitura de “Emilio”, de Rousseau, que é justamente a obra sobre a pedagogia, sobre educação, o que ela emblematicamente representou, não tanto pelas suas conclusões particulares, mas, exatamente, pela postura que Rousseau assumiu na consideração da educação (Eu indicaria a todo professor, pedagogo, educador a ler Emilio e Robson Crusoé.) sobretudo, no fato de está descobrindo a infância e a criança como sujeito central do processo pedagógico. Falarei, oportunamente, de Jean Jaques Rousseau aqui no blog.
Para kant, todos os investimentos pedagógicos devem ser na direção de promover a busca pela perfeição, que se dá na plenitude da moralidade. Para tanto, deveria se promover a disciplina, não como uma forma de opressão, mas para superar o comportamento puramente instintivo. Valorizava a ampliação do conhecimento, particularmente o conhecimento cientifico, mas também da arte e da estética. Acreditava, enfim, que o sujeito deveria tornar-se cada vez mais moral, prudente, culto e emancipado.
De toda esta proposta da filosofia kantiniana, certamente nós podemos concluir que a tarefa da politica, no que diz respeito a sociedade e a tarefa da educação, no que diz respeito a pessoa humana, é transformar, é de transformar todos os sujeitos humanos em processos de educação em sujeito disciplinados, que busquem superar, que busquem viver, independente de sua materialidade animal, de suas pulsões instintivas, ( já publiquei aqui no blog que Nietsche priorizava,ao contrário de Kant, o instinto) em um sujeito culto que explore todas as sua potencialidades de conhecimento, particularmente a partir da ciência, em um sujeito prudente que saiba conviver com as circunstancias históricas no espirito de paz, de harmonia social e, finalmente, de um sujeito moral, ou seja, aquele que atingiu a plenitude de uma existência pautada nas exigências transcendentais da eticidade. Talvez estamos aqui, certamente, diante de palavras talvez muito marcadas pelo seu tempo histórico, mas que na sua significação mais profunda, continua tendo extrema validade no contexto histórico contemporânea, e em educação, estes mesmo desafios, tentando responder: “quem somos nós os homens?” ; “ O que podemos saber?” ; “ E o que devemos fazer?”.

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